
Na tarde de ontem, o cardeal Ratzinger, hoje papa Bento 16, pode ter se lembrado de sua infância em Trunstein. Foi nesse recanto que ele tomou parte da Juventude de Adolf Hitler, grupos de crianças e adolescentes que eram "formados" para prestar apoio ao governo nazista.
Trocando-se algumas palavras, "formados" pode ser substituída por "catequizados" e "doutrinados", enquanto "prestar apoio", com um pouco mais de tolerância, podem ser substituídas por "acolitar", designação própria de quem presta serviço religioso.
O poder papal, tal como o poder – e não a autoridade, fundada em outras bases – totalitário, fundamenta-se na ameaça de uma sanção, que comina apenas contra quem viola uma lei. Se Hitler, pela força do estado e exército nazista, coagia os seus séquitos a perseguir, prender, maltratar e assassinar uma enorme massa de inocentes, em seguimento da doutrina ariana, o papa igualmente mantém uma cada vez menor e menos substantiva plêiade de fiéis defendendo renitentes e de forma cada vez mais estereotipada ensinos que para nada mais servem senão para evidenciar a irrelevância das ideologias defendidas pelo grupo majoritário do catolicismo.
Por certo, existe nos arraiais do catolicismo pessoas com posicionamentos mais moderados e que sabem dialogar de modo mais produtivo com os demais segmentos da sociedade, entretanto constituem um grupo menos substantivo ainda e sistematicamente silenciado pelo alto prelado, desde o tempo em que Ratzinger era prefeito da Congregação para Doutrina da Fé – em épocas medievais a Inquisição do Santo Ofício – e condenou, por exemplo, Leonardo Boff ao silêncio obsequioso (proibição de divulgar suas idéias, em especial as contidas no seu principal escrito Igreja, carisma e poder). Hoje em dia é Jon Sobrino que sofre uma punição até mais severa do que a imposta a Boff.
A igreja é um meio asfixiante e castrador para quem propõe-se a verbalizar, de modo menos dogmático e mais próximo dos anseios do povo, uma teologia capaz de atualizar princípios libertadores contidos nos evangelhos. O esforço, feito pelo alto clero, em decepar os movimentos mais engajados socialmente dentro da igreja fazem com que a massa alienada e alienante comporte-se exatamente como se tem portado a multidão dos centenas de milhares de acólitos de Bento 16 nas terras tupiniquins.
Impregnando suas ações de medo e conservadorismo dogmático, tentando converter a 5ª Celam (Conferência Episcopal Latino-Americana) – que já foi um marco do pensamento social da igreja, quando o papa Paulo 6°, o primeiro a visitar a América Latina, abriu a 2ª Celam (Medellín) em 24 de agosto de 1968 – em um fórum limitado a repisar o discurso hipócrito-moralista do ideário segregacionista do clero (que mantém impedidos da eucaristia os que se divorciam, condena a adoção de ações contraceptivas e busca limitar dentro do âmbito da moral católica políticas educacionais e de saúde que há muito tempo já deveriam ter sido assumidas pelo Estado), Bento 16 estará próximo de liderar um grupo que, mesmo sendo numericamente significativo, não terá nada mais a oferecer a sociedade do que uma imagem de tietagem estereotipada, com berros de "Olê, olê, olê! Bento, Bento!". Ou como sugere a foto acima, captada no encontro com a Juventude Católica, "Heil papa!".
Ora, se os conferentes do 5° Celam da mesma maneira procederem, nodoarão a história de lutas e de posicionamentos equilibrados que até aqui marcaram a conferência e se conspurcarão também. Há certos momentos em que se exige, mesmo sob ameaça, que de nenhum modo se faça silêncio.
* A foto acima foi retirada do Destak SP, edição 203, de 11/5/2007, com crédito de Vidal Cavalcante/Agência Estado.
4 comentários:
Mas o reino do Bento não obriga nenhum religioso a se manter calado. Só se mantem calado quem recebe esta pena e não quis sair.
Aliás, o Márcio falou sobre você escrever um texto por Na Cal. Eu acho ótimo. Se animar, é só me avisar (sidartamartins@yahoo.com)
Abraços,
Sabe, Silvio, creio que isso não seja restrito ao catolicismo, mas que também se estenda em outras religiões (digo aqui religião como instituição...). O sonho de consumo de uma liderança déspota é governar sem objeções, estas naturalmente oriundas de cabeças pensantes... Bjs!
Parabéns, ótimo artigo!
Postar um comentário